Elon Musk demitiu um engenheiro do Twitter após descobrir que seu engajamento na plataforma caiu porque o interesse nele caiu. Desde que formalmente comprou a empresa em novembro de 2022, Musk se provou como uma pessoa terrível, demitindo mais da metade dos funcionários, abrindo as portas para neonazistas e supremacistas brancos reingressarem na plataforma e publicando tweets conspiratórios da extrema direita. As expectativas já eram baixas para seu “reinado” no Twitter, mas ele fez questão de piorá-las.
O problema é que além de ser um imbecil na sua vida privada — assediando moral e sexualmente seus funcionários —, as consequências da imbecilidade de Elon Musk agora respingam no mundo real. Nenhuma empresa de rede social é perfeita, simplesmente por ser impossível aperfeiçoar algo que existe há menos de vinte anos. Mas existem formas de deixar tudo pior e no caso do Twitter, uma plataforma pequena, mas que abriga majoritariamente um público interessado em discussões sociopolíticas, isso é um problema.
Após demitir um engenheiro porque descobriu que não é amado o suficiente, Musk fez com que o restante da equipe de programadores do Twitter aumentassem seu engajamento em até “1000” vezes, reportou a newsletter Platformer, que cobre tecnologia e redes sociais. Ele demandou a criação de um sistema especial para que seus tweets fossem expostos na timeline de outros usuários a força, contrariando seu discurso anterior a compra da empresa, de que a internet deveria ser como antes e usuários deveriam ter total controle sobre o conteúdo que lhes é recomendado.
Apesar de, segundo a newsletter, engenheiros do Twitter terem dito que esse “super engajamento” só estaria sendo aplicado a conta de Musk, a existência dessa funcionalidade levanta questionamentos. Próximo à revelação de que Musk havia demitido o engenheiro, ele implorou aos seus seguidores que engajassem nas campanhas dos últimos anunciantes que restam na plataforma. Dito isso, qual seria a possibilidade do mesmo não pedir que engajamento fosse usado para alimentar e impulsionar suas visões políticas, uma vez que com as eleições para a presidência dos Estados Unidos em 2024, isso faria com que ele ganhasse mais anunciantes e reaver a perda de 44 bilhões no seu patrimônio?
Nas últimas semanas, pesquisadores estão conseguindo quantificar e analisar metodicamente como as decisões de Elon Musk sobre a moderação no Twitter — guiadas por uma visão neoliberal extrema da liberdade de expressão — estão afetando o discurso político e tendo consequências reais. Um pesquisador australiano constatou que desde o começo de 2023, o Twitter está impulsionando cada vez mais tweets contendo a teoria da conspiração da “morte súbita”, que alega uma suposta correlação entre mortes esquisitas às reações adversas a vacina de COVID-19. Esse discurso é um terreno fértil para o compartilhamento de desinformação sanitária que, caso se espalhe e convença o mundo, pode acabar desencadeando uma nova pandemia.
Perfis de neonazistas e supremacistas brancos também voltaram e o Twitter está lucrando com publicidade nessas contas enquanto beira o precipício da falência. Um relatório do Centro de Combate ao Ódio Digital (CCDH, na sigla em inglês) publicado em 10 de fevereiro mostra que o Twitter ganhará até 19 milhões mostrando #publis em até 10 contas de extremistas reintegradas na rede social após as novas políticas de Musk sobre moderação. Mas não se preocupe, o Twitter não é parcial apenas para neonazistas: uma dessas contas é de um cara acusado de tráfico humano, pornografia infantil, escravização infantil e estupro de vulnerável — e, claro, da extrema direita também.
Além do discurso político, o mundo está mais inseguro: o Twitter agora está falhando em conter o compartilhamento de pornografia infantil na plataforma. Para uma reportagem do New York Times publicada em 6 de fevereiro, o jornal criou um robô para automatizar pesquisas sobre pornografia e abuso infantil, e descobriu que imagens de 10 vítimas apareceram mais de 150 vezes em vários perfis. Esse problema não é novo e o Twitter já deixou de lançar projetos importantes porque reconheceu — internamente, é claro — que não sabe lidar com o problema. No entanto, o problema piora ao colocarmos na balança que o CEO do Twitter prefere usar a rede social para lidar com seus problemas maternos e de autoestima do que com literais crimes cometidos na plataforma.
Vários ex-funcionários do Twitter testemunharam a Federação Nacional do Comércio (FTC, na sigla em inglês) dos Estados Unidos desde o primeiro semestre de 2022 que a plataforma é totalmente insegura. A empresa tem até mesmo uma funcionalidade que permite qualquer engenheiro comandar a conta de outra pessoa. Dados privados de 25 milhões de contas estavam a venda na internet até janeiro de 2023, e ninguém fez absolutamente nada. Quais são as implicâncias disso no mundo real, sabendo que a empresa tem um dono de faz-de-conta que usa a empresa para fins pessoais, com uma base de usuários de milhares de jornalistas, ativistas, governos e funcionários públicos?
O mundo não vai acabar junto com o Twitter. Ele só vai ficar mais previsível, porque todos — inclusive as autoridades americanas que forçaram essa compra — sabíamos que quando Elon Musk comprasse a empresa, ela afundaria ao lado da sua reputação. Não são apenas pesquisadores e políticos que enchiam a paciência de todo mundo, até mesmo escritores de ficção científica do século passado sabiam o tamanho da desgraça que o mundo estaria enfiado caso pessoas super ricas, sem compaixão e qualquer senso de moral, pudessem controlar abertamente a opinião pública pela internet.