O Brasil está vendo um número exorbitante de tiroteios escolares

Em 2022, tiroteios escolares no Brasil fizeram o mesmo número de vítimas que os EUA em 2018. Essa catástrofe está associada a um conjunto de fatores associados ao extremismo de direita. No novo governo Lula, esse problema deve ser uma das prioridades.

Os Estados Unidos tiveram um número histórico de tiroteios escolares em 2022, com 51 ocorrências e 46 fatalidades ao todo. O mais letal foi em 24 de maio, quando um homem de 18 anos invadiu uma escola primária em Uvalde, no estado do Texas, e assassinou 21 pessoas, 19 delas crianças. A cada ano, o mundo fica perplexo com as consequências da armamentista americana, que alinhada ao supremacismo branco se torna uma catarse para a violência entre jovens. Agora, infelizmente, o Brasil passa por uma situação semelhante.

O Brasil teve, em 2022, 35 mortos e 72 feridos em decorrência dos tiroteios escolares, quase o mesmo número que os EUA em 2018 (35 mortos e 79 feridos). Apesar de o Brasil ter um número menor de ocorrências que os americanos, elas parecem ser mais letais. Alguns estados da federação tiveram mais casos que outros, como Goiânia, que viu 8 ataques, em comparação ao Rio de Janeiro e Distrito Federal, ambos com 2 ataques.

Esses dados são do relatório produzido por um grupo de pesquisadoras ao lado do professor Daniel Cara durante o governo de transição de Lula em dezembro, cujo propósito foi alertar o novo governo sobre a crescente influência da extrema direita nos jovens brasileiros. As estatísticas ali apresentadas mostram que ao contrário dos EUA, o Brasil teve seu primeiro ataque em escola em 2002. Na ocasião, um estudante de 17 anos matou duas colegas na escola que estudava, em Salvador. O adolescente roubou a pistola de seu pai, que era perito da Polícia Civil.

Desde então, o Brasil teve 16 ocorrências de ataques em escolas, 4 dessas apenas entre junho e dezembro de 2022. O Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003, que proibiu a venda e porte de armas para cidadãos comuns, pode ter influenciado o fato que o Brasil não viu ataques em larga escala com dezenas de vítimas, como nos Estados Unidos. Entretanto, isso certamente não impede os autores desses atos, que são muitas vezes motivados e cooptados por ideologias supremacistas e violentas da extrema direita. É o caso do jovem que, em fevereiro de 2023, tentou incendiar sua antiga escola vestindo uma braçadeira nazista, mas sem armas de fogo.


Relacionado

Como evitar atentados de extrema direita nas escolas brasileiras

Documento elaborado por equipe de transição de Lula sugere integração de escolas à comunidade, educação crítica para uso da internet e extinção de escolas militares mirins; adolescente matou 4 pessoas em ataque no ES em novembro


Dito isso, analisar a questão faz necessário observar o problema não apenas pela política armamentista, mas também a cultura da extrema direita, o cenário político nacional e inúmeros outros problemas que o país enfrenta hoje.

Parte da simbologia neofascista que atiradores em escolas usam — tanto nos EUA, quanto no Brasil e outras partes do mundo — faz parte da cultura Siegedescrita pelo Centro de Pesquisa e Evidência Sobre Ameaças À Segurança (CREST, na sigla em inglês) como a maior e mais perigosa demonstração do neofascismo até hoje. Essa cultura, com seu ecossistema singular de linguagem e signos extremistas, tem pontos estéticos semelhantes que criam uma “estética” e “comunidade” aos adolescentes e jovens adultos que cometem esses atos terroristas. É o caso de quando esses atiradores brasileiros usam máscaras de caveiras, um símbolo original da cultura supremacista dos EUA.

O novo governo Lula instituiu, por meio do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, um grupo de trabalho que, por 180 dias, terá a tarefa primordial estudar e discutir estratégias para combater o discurso de ódio e extremismo no Brasil. A equipe formada contém pesquisadores, acadêmicos, influenciadores digitais, jornalistas e outros profissionais. Nesse sentido, é de suma importância ao futuro da juventude brasileira — que tenha o direito de frequentar ambientes escolares e universitários sem medo do supremacismo — que o governo preste atenção a este fenômeno.



Relacionado



Conheça o podcast


Assine e receba notificações sempre que postarmos algo novo!


Quer escrever com a gente? Fala com o editorial:


Do Pegasus às joias

Uma história de opressão e crueldade que ecoa nos horrores do passado, lembrando-nos que a luta pelos direitos humanos ainda tem um longo caminho a percorrer

I Love Big Brother

O objetivo do banimento e da censura não é expelir ideias odiosas e nem ilegais; é afugentar ideias divergentes.

“A minha resposta é simplesmente voltar ao papel e escrever mais letras” — G Fema

G Fema, rapper portuguesa, tem conquistado espaço no cenário musical com uma obra marcada pelo feminismo e pela sensibilidade em relação às suas origens cabo-verdianas. Em seu último single, “Ami É Fema”, a artista presta homenagem às mulheres que lutam por representatividade em uma sociedade dominada por homens. A rapper também se insere no movimento…

Elon Musk me irrita

Enquanto você se preocupa com os tweets de Elon Musk, o Twitter abarca e lucra cada vez mais com extremistas de direita, não consegue conter pornografia infantil e explora a mão de obra de seus funcionários.

Um grito punk no Carnaval de São Paulo

Para ocupar as ruas é necessário ter responsabilidade!” Assim começa a convocação de carnaval do Bloco 77, que neste ano comemora 10 anos de fundação. Entre a folia e a luta, contamos um pouco sobre a história dos “Originais do Punk”.

Portugal, o país da casa imprópria

Em Portugal, a especulação imobiliária fomentou uma crise habitacional. Ao lado do aumento no custo de vida e inação do governo, cidadãos passam por situações inimagináveis. Conversamos com essas pessoas para entender e compartilhar suas histórias, além de ouvi-las em como o país pode sair dessa crise.

Carregando…

Ocorreu um erro. Atualize a página e/ou tente novamente.