O apoio dado pelo ex-presidente Bolsonaro ao príncipe Arábia Saudita, acusado de estar envolvido com a tortura e assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, é algo que não pode passar despercebido. É preocupante ver líderes políticos apoiando regimes que violam os direitos humanos e a liberdade de imprensa.
O jornalista Jamal Khashoggi era um crítico ávido da monarquia saudita e seu posicionamento político ia contra a ideia de democracia defendida pelo país. Ele exilou-se nos EUA em 2017 e tornou-se jornalista do Washington Post. Khashoggi denunciou várias violações dos direitos humanos na Arábia Saudita, incluindo a prisão e tortura de ativistas de direitos das mulheres, como Loujain al-Hathloul.
Ao apoiar o príncipe Arábia Saudita, o ex-presidente Bolsonaro demonstrou pouco respeito pelos valores da liberdade de imprensa e pelos direitos humanos. O assassinato de Jamal Khashoggi foi um ato covarde e brutal que deve ser condenado por todos que acreditam na importância da liberdade de expressão e da proteção dos direitos humanos.
Mulheres agora têm o direito de dirigir na Arábia Saudita desde 2018, mas para Loujain al-Hathloul, essa conquista foi realizada atrás das grades. Em março de 2018, ela foi sequestrada nos Emirados Árabes Unidos e levada de volta para a Arábia Saudita, onde tem sido torturada com choques elétricos, açoitada e ameaçada de estupro até os dias de hoje.
Antes de ser assassinado, o jornalista Jamal Khashoggi estava trabalhando em um documentário com Omar Abdelazi, um crítico do regime saudita que agora vive exilado no Canadá. Infelizmente, o smartphone de Khashoggi estava infectado com um spyware israelense Pegasus, provavelmente implantado por um operador saudita.
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Uma arma em potencial de primeira linha.
Em outubro de 2018, Khashoggi foi ao consulado da Arábia Saudita em Istambul, mas nunca foi visto saindo de lá. Inicialmente, os oficiais do governo negaram envolvimento em seu desaparecimento, alegando que ele havia se envolvido em uma briga no edifício. No entanto, a CIA conduziu uma investigação que resultou em várias evidências que comprovam que Khashoggi foi sedado, esquartejado com uma serra de ossos e teve seu corpo dissolvido em químicos. Surpreendentemente, o então presidente dos EUA, Donald Trump, duvidou do trabalho da CIA, causando indignação entre funcionários da agência.
A história ainda está sem conclusão. Mesmo após diversas denúncias de abusos, desrespeito aos direitos humanos, torturas e assassinatos, além de um ano desde a morte de Khashoggi, várias empresas que haviam feito embargo voltaram a estabelecer laços comerciais com a Arábia Saudita. Fica implícito que, se você é um regime ditatorial que assassina jornalistas independentes, persegue mulheres que lutam por direitos humanos básicos e as tortura sumariamente, isso é algo inaceitável. Mas, se você tem petróleo e laços comerciais lucrativos, tudo isso parece ser tolerado.
O último escândalo envolvendo as joias recebidas pela família Bolsonaro, presenteadas pelo reino saudita, levantam mais questionamentos. A comitiva do ex-presidente tentou, ilegalmente, trazer para o país conjuntos de joias avaliadas em mais de R$16 milhões que teriam sido supostamente um presente do governo saudita. O episódio teria ocorrido em outubro de 2021, como revelou o jornal Estado de São Paulo. Nesse mesmo mês, 11 mil pessoas morreriam de COVID-19 no Brasil. A Receita Federal interferiu na tentativa, apreendendo os bens, que deveriam ser patrimônio público conforme a legislação federal.
Bolsonaro tentou recuperar as joias ao menos oito vezes, usando terceiros do seu próprio gabinete em diferentes ministérios e militares — a última tentativa aconteceu em 29 de dezembro de 2022, três dias antes do término do mandato.
Sabemos que um dos filhos do ex-presidente, o vereador Carlos Bolsonaro, tentou mediar a compra do Pegasus para o governo federal, mas sem sucesso. A revelação veio pouco após o escândalo que revelou o uso do spyware para monitorar e espionar jornalistas, ativistas e políticos em todo o mundo. Em quatro anos, o ex-presidente e sua equipe viajaram para a Arábia Saudita ao menos 150 vezes. Apesar de as relações econômicas entre os países ser forte, não justifica a proximidade, uma vez que a China, o maior parceiro comercial brasileiro, não teve a mesma preferência.
Este texto é apenas um vislumbre da complexa geopolítica árabe, mas é crucial entender que essa não é uma “simples morte” rotineira. Os episódios dos últimos quatro anos são um lembrete importante sobre a proteção de dados, a liberdade de imprensa e os direitos humanos que merecem ser defendidos em todo o mundo, inclusive no Brasil.